segunda-feira, 16 de junho de 2014

O problema da Selecção

Há pouco mais de uma semana, argumentei num texto que o jogo mais importante da Selecção Portuguesa no Campeonato do Mundo no Brasil não era o primeiro, frente à Selecção Alemã. 


Continuo a achar que não é preocupante entrar em campo na segunda jornada com zero pontos, dados os adversários que nos calharam em sorte na primeira fase da competição. Mas o que é assaz preocupante é ter de analisar tão confrangedora exibição dos comandados de Paulo Bento.

Durante e imediatamente após o jogo, ouvi e li as mais variadas "explicações" para tamanho desaire, das quais se destacavam três: o árbitro, as condições meteorológicas e os (não) escolhidos de Paulo Bento, tanto a nível dos 23, como dos 11 que iniciaram a partida.

Comecemos pelas condições meteorológicas. Este argumento é simplesmente absurdo. Não digo que as condições fossem fáceis, muito menos as ideais. Mas quantos jogos fazem os jogadores alemães (tirando os que jogam em clubes espanhóis, uma minoria) com temperaturas a rondar os 30 ºC? Em quantos jogos estão presentes jogadores da selecção portuguesa disputados sob queda de neve e/ou temperaturas negativas?

Relativamente às escolhas de Paulo Bento, nada há a fazer quanto aos 23 que embarcaram para o Brasil. É ele o responsável pelas opções, tem todo o direito a elas. O tempo para as críticas foi no próprio dia em que as opções foram divulgadas. A partir daí, são a casa que escolhemos para viver, são o destino de férias que escolhemos. No final da prestação da equipa na competição, poderá e deverá ser julgado por elas. O mesmo não acontece quanto ao onze apresentado. Cristiano Ronaldo parece estar, de facto, fisicamente a 100 %, pelo que não se põe a questão que levantei na passada semana. Mas deixar William Carvalho no banco e colocar a jogar Miguel Veloso é extremamente grosseiro e injusto. Não questiono os outros dez, também penso serem aqueles que, à partida, oferecem mais garantias de sucesso. Mas Miguel Veloso nunca mostrou nada digno de nota com a camisola das quinas. O que não significa que não se esforce ao máximo, que não dê tudo quando joga. Mas esse tudo é claramente insuficiente, especialmente tendo em conta que nunca houve problemas de alternativas para essa posição.

Por fim, o árbitro. Acusar este de ter prejudicado a nossa selecção é, para além de argumento de um eterno perdedor, absolutamente injusto. Considero até que, globalmente, foi mais prejudicial para os alemães. A grande penalidade assinalada tem motivos, na lei do jogo, para o ser. O que faltou foi mostrar a João Pereira o cartão vermelho em vez do amarelo. Depois, a equipa de arbitragem, com 2-0 no marcador, permitiu que Fábio Coentrão, em fora-de-jogo, receba a bola e a passe para Cristiano Ronaldo, também em posição irregular, originando uma claríssima oportunidade para marcar, tendo um defesa alemão atirado a bola para lá da linha de cabeceira. A equipa de arbitragem não invalidou a jogada, que, para nosso azar, não deu golo, e cedeu canto, indevidamente. E, finalmente, a expulsão de Pepe. Mas desde quando é aquela uma expulsão forçada? O árbitro teve toda a razão em expulsar o irreflectido central. Não há nada que pudesse justificar aquele comportamento, recorrente, aliás.

E isto leva-me às razões pelas quais Portugal perdeu o jogo. É verdade que houve uma grande penalidade clara sobre Éder não assinalada. Mas esta aconteceu nos últimos quinze minutos da partida, com o marcador a indicar 3-0, frente a uma selecção que já geria o encontro, esperando o seu final. E mesmo que o árbitro nos tivesse prejudicado? Estamos sempre com vontade de ver a história do herói, que é injustiçado, que apanha uma coça tão colossal quanto desleal, mas que ressurge, com tantas mais forças quantas as injustiças a que é sujeito. Mas depois não aproveitamos o enredo e não cerramos os dentes, não fazemos das fraquezas forças, queixamo-nos de tudo e de todos menos das nossas pernas e das nossas opções.

Portugal perdeu o jogo porque não pôs o pé, porque não ganhou um ressalto, não venceu um único duelo corpo-corpo, não ganhou uma disputa de uma bola aérea (a inércia de Pepe no segundo golo e a displicência de Bruno Alves no terceiro são visíveis apenas nos campeonatos distritais), não fez três passes consecutivos. A exibição foi má? Não, foi paupérrima! E o que aflige é que os alemães nem sequer forçaram, bastou trocar calmamente a bola e ter os seus jogadores a oferecerem linhas de passe objectivas.

Eu tinha afirmado que não era importante, em termos de objectivos, vencer a Alemanha. Mas tive o cuidado de referir que isso não significava que não se devia entrar para ganhar o jogo.

Não basta dizermos que somos bons. Não basta dizer que somos famosos. Têm sucesso aqueles que fazem precisamente o contrário, aqueles que não se põem em bicos-dos-pés, aqueles que não empinam o nariz, aqueles que não chamam as notícias. Foi assim em 1966, em 2000 e em 2004. Um pouco em 2006. Teimamos em não aprender com os erros (de 1986, 2002 e 2008). É preciso fazê-lo. É preciso corrigir os erros. E é preciso começar por Pepe. Hoje, lembrei-me de um senhor do futebol: Bobby Robson. Lembrei-me do que ele fez quando, num jogo importante em casa do rival de sempre, Fernando Couto foi expulso, deixando a equipa desequilibrada, exposta à derrota que se anunciava. Sir Robson colocou Fernando Couto a treinar sozinho durante várias semanas. E só foi novamente convocado, para o banco, dois ou três meses depois. É um exemplo que deve ser agora seguido - não esqueçamos que Fernando Coutou era, à data, considerado indubitavelmente o melhor central português, já acossado por equipas europeias ricas. Eu, de forma a proteger o grupo, castigaria Pepe com, pelo menos, seis jogos (aqueles que faltam para chegar à final), independentemente do castigo que vier a ser aplicado pela FIFA.

Já chega de termos medo de nós. Já chega de soberba, de anúncios publicitários. São jogadores de futebol. Não faz mal darem tiros transviados, uma grande penalidade qualquer um pode falhar. Atirem! Atirem! Atirem para a baliza, ao lado, mas atirem! Só não dêem tiros nos pés! Estes são precisos para a prática de futebol ao mais alto nível. Penso que mais alto do que o desta competição não existe.



segunda-feira, 9 de junho de 2014

O bom mau aluno


Portugal é, reconhecidamente, um país simpático. Os portugueses são elogiados em todo o mundo. Também os seus governos são muito bem considerados. Mas estes só pelas instâncias internacionais. Aquelas que não são escrutinadas pelos eleitores (expressão tão do agrado, neste momento, de Pedro Passos Coelho e dos actuais dirigentes do PSD).

Os governos de Portugal não têm sido bons governos. É, em grande parte, devido a eles que vivemos na situação em que vivemos. Mas este governo em particular, adjectivado de "bom aluno" pelos elementos da troika, com constantes avaliações positivas por parte do seu tutor, acaba de se auto-intitular de "mau aluno". Ao pedir, hoje, 9 de Junho de 2014, que atrasemos o calendário para 30 de Novembro de 1640, que a troika permaneça mais tempo em Portugal, para resolver o problema derivado da inconstitucionalidade do seu último Orçamento de Estado apresentado, Pedro Passos Coelho assume que não resolve exercícios novos sem o tutor ao seu lado, a guiá-lo, passo a passo. Este é o mais néscio Governo da III República. Passos Coelho e o seu Executivo já viram Orçamentos de Estado chumbados por duas vezes e orçamentos rectificativos por outras cinco. Já era tempo de terem aprendido a lição. Foram muitos os exercícios feitos. Mas, agora que o professor se encaminha para a porta de saída e é apresentado novo teste, o Governo Português mostra-se incapaz perante o desafio, em tudo igual aos anteriores, ainda tão recentemente ultrapassados. E brada, bem alto, para que a porta não se abra.

A verdade é que isto não surpreende. Os métodos de resolução aprendidos e apreendidos foram apenas dois: aumento de impostos e corte de salários, pensões e benefícios. Não se cortaram as regalias nem se fizeram as tão urgentes reformas. Ou seja, a redução do défice não é sustentável. Sairá este Governo e os problemas económico-financeiros voltarão a assombrar-nos e limitar-nos. Tal estultice sair-nos-á cara. Muito cara! E pagá-la-emos aos nossos actuais governantes, numa qualquer gigantesca empresa.

Somos um povo com uma capacidade enorme de sofrimento. O fado é o nosso fado. Foram oito séculos de submissão à nobreza e ao clero. Quase meio século de uma ditadura repressiva, opressora, impedimento de desenvolvimento. E quatro décadas de inépcia das supostas elites em servir o bem comum, o bem público. Até quando vamos deixar que sejamos um bom mau aluno?

domingo, 8 de junho de 2014

Tacticismo para o Campeonato do Mundo

O início do Campeonato do Mundo de futebol está prestes a verificar-se. A selecção portuguesa estrear-se-á no dia 16 de Junho, frente à Mannschaft. Seguir-se-á a selecção norte-americana, sendo concluída a fase de grupos frente ao Gana.


Enquanto entusiasta e amante de futebol, acredito que cada jogo deve ser encarado e preparado para vencer, não importa se o adversário é, teoricamente, muito mais forte ou fraco. No entanto, em partidas que não têm importância apenas de forma isolada, para serem atingidos os objectivos pretendidos, não pode ser esquecido o pragmatismo.



Nas fases finais das competições, é habitual dizer -se que o primeiro jogo é o mais importante. Que é muito importante vencê-lo. Contudo, no caso que nos diz respeito, a minha opinião é precisamente a contrária. A Alemanha, campeã mundial por três vezes, é sempre uma crónica candidata à chegar à final. E ninguém, no seu perfeito juízo, dirá, sem esboçar um sorriso irónico, que Portugal é favorito para esse encontro. Assim sendo, o nosso campeonato, na fase de grupos, é contra as outras duas selecções que nos calharam em sorteio. E isso leva-me à questão que tem tido tanto direito de antena (em demasia, diria eu) nos serviços noticiosos de televisão e rádio e na imprensa: a lesão de Cristiano Ronaldo.



Há cerca de três anos, afirmava eu que, até então, jogar com Cristiano Ronaldo era jogar com dez em campo (na selecção, claro). A partir do Euro 2012, CR7 mudou e passou a ser, na minha opinião, um jogador mais qualquer coisa entre outros dez. E as suas influência e prestações têm sido cada vez mais notórias. É, assim, natural (mas desmedida) a preocupação pela sua limitação nos treinos de preparação para a competição.



Assim sendo, penso que a sua utilização no primeiro jogo da fase de grupos não será aconselhável. Pelo menos, no onze inicial. Será mais importante tê-lo plenamente recuperado para vencermos os jogos que são, quanto a mim, os realmente importantes. Isto não invalida que a equipa, sem CR7, não jogue para vencer os germânicos. Tanto melhor, se conseguirem os três pontos. Mas o importante será vencer EUA e Gana e, de seguida, as finais que antecedem a final, bem como esta.



No xadrez, ninguém vence sem sacrificar algumas pedras. Portugal não tem armas suficientemente fortes para vencer sem algum tacticismo. Espero que tenha o discernimento para o desenhar e implementar.



Boa sorte, Portugal!



P.S.: quero também desejar boa sorte ao Brasil e aos brasileiros. Hoje, ainda não estou certo, dadas as notícias que têm chegado, que a competição será iniciada ou terminada. Para mim, o futebol não pode ser mais importante do que a Saúde e a Educação da população. Mas, já que se chegou até aqui, será sensato garantir que tudo corra bem. As manifestações serão inevitáveis. Esperemos que sejam pacíficas. Boa sorte, Brasil!


segunda-feira, 2 de junho de 2014

Pedro, o Inconstitucional

Pedro quis governar. Pedro apresentou os seus argumentos, disse estar preparado e ter feito as contas. E fez as contas com os mesmos dados que a troika dispunha. Pedro apoiou-se em Eduardo, o Taxado. Pedro venceu José, o Filósofo, e aceitou o cargo ingrato em tempos e condições difíceis. Mas desejava-o e aceitou-o. E fê-lo começando por jurar cumprir uma série de orientações definidas como a lei fundamental da República Portuguesa - a Constituição.

Pedro constituiu a sua corte: Vítor, o Colossal; Paulo, o Irrevogável; Maria Luís, a Imposta; Pedro, o Motard; Álvaro, o Teórico. Pedro era observado e orientado por Durão, o Cherne, e Christine, la Garde. E, tal como a grande maioria dos governantes que o antecederam em quase nove séculos de História, tem reinado à revelia do que são as mais elementares expectativas de quem é governado. E também à revelia da Constituição Portuguesa.

Pedro e a sua corte não conseguiram, em três anos, apresentar um Orçamento de Estado que não violasse a lei que jurou cumprir. Pedro diz que a culpa não é sua: é da lei, que é má, e daqueles cuja única função é verificar e garantir que aquela é cumprida. Pedro e a sua corte são injustos: conheciam, quando se apresentaram a eleições, as condicionantes portuguesa e europeia.

Pedro não concorda com a lei, mas não convenceu o número de deputados necessário para a alterar. E, portanto, tem de a cumprir tal como ela está plasmada. Se Pedro quiser ser um praticante de basquetebol e não conseguir pontuar através de um afundanço, pode pedir uma alteração à lei que define a altura do cesto. Mas, se não lha concederem, só tem duas alternativas: ou aprende a lançar a bola ou desiste de jogar.

Pedro fez ainda algo pior: conhecendo o resultado das suas acções anteriores, chantageou os juízes do Tribunal Constitucional , afirmando publicamente que estes seriam responsáveis pelas medidas alternativas àquelas que fossem chumbadas. É o mesmo que Pedro, se fosse um réu, culpar um juiz que o condena a uma pena de prisão pela sobrelotação dos estabelecimentos prisionais.

Pedro é injusto. Pedro não sabe nem quer jogar de acordo com as regras pré-estabelecidas. Pedro governa. Mas há-de deixar de governar. Pedro terá o seu lugar na História. Pedro, o Inconstitucional, não será esquecido.